ARTIGOS PARA O PÚBLICO | VACINA PNEUMOCÓCICA POLISSACARÍDEA

Dra. Rosana Richtmann
Médica Responsável do CCIH do Hospital e Maternidade Santa Joana
Médica Assistente do Centro de Imunização Santa Joana




Como é sabido, o Streptococcus pneumonie é o campeão na etiologia de pneumonia e meningite bacteriana nos EUA, levando a 175.000 hospitalizações/ano e cerca de 7000 a 12500 mortes anualmente. Além disso, o pneumococo pode causar infecções como otite média e sinusites. Os principais grupos envolvidos nos quadros de infecção pneumocócica são os lactentes, os idosos, os imunodeprimidos, fumantes entre outros. À medida que os pacientes envelhecem, aumenta a taxa de ataque de pneumonia, bacteremia e morte. Há cerca de 100 anos atrás, Sir Willian Osler, considerava a velhice como fator de risco para infecção invasiva pneumocócica, citando frases como: ”a pneumonia é o final natural das pessoas idosas...”. Definimos como idosos os indivíduos com idade >65 anos e estima-se que em 2050 a população idosa no mundo irá triplicar, com o aumento da expectativa de vida. Esta estimativa nos leva a supor que o pneumococo vai se tornar ainda mais “famoso” nos próximos anos na população idosa.

Usaremos neste texto o termo doença invasiva pneumocócica (DIP) para definirmos casos de pacientes que apresentam cultura positiva para S. pneumonie de algum sítio estéril corpóreo. Lembramos ainda que 30 a 50% dos casos de pneumonia pneumocócica estão associados à DIP. Outro dado importante é que a taxa de letalidade relacionada à DIP varia conforme a faixa etária, podendo variar de 20% para pacientes com 65 anos e 40% para os maiores de 85 anos. Portanto, se considerarmos o aumento do risco de DIP com o avançar da idade, os custos associados à infecção pneumocócica e o aumento da resistência atribuída ao pneumococo em todo mundo, concluímos que a vacinação anti-pneumocócica deve ser uma prioridade de saúde pública.

Temos disponível no mercado hoje a vacina anti-pneumocócica polissacarídea 23-valente (VPP-23v) e a vacina anti-pneumocócica conjugada 7-valente (VPC-7v). Apesar de serem conhecidos mais de 90 diferentes sorotipos do S.pneumonie, 85 a 90% das DIP envolvem um dos 23 sorotipos contidos na vacina VPP-23v. Portanto estamos neste momento diante de pelo menos três questionamentos:

• Qual a eficácia da VPP-23v?
• Qual a imunogenicidade da VPP-23v?
• Qual a duração da proteção e conseqüente necessidade de revacinação?

Em relação à eficácia, estudos e observacionais indicam a eficácia de 50 a 70% em prevenção da DIP nos idosos. A eficácia contra outras infecções pneumocócicas não invasivas é muito difícil de estabelecer, principalmente por problemas metodológicos. A “ACIP- Advisory Committee on Immunization Practices” dos Estados Unidos, recomenda a vacinação universal em todas as pessoas 65 anos.

Em relação à imunogenicidade relacionada à VPP-23v temos grande limitação técnica para determiná-la, visto que os marcadores clássicos de imunidade como resposta anticórpica, é de difícil caracterização para anticorpos anti-cápsula polissacarídea específica pneumocócica (Ac-P). Concluindo, falta uma metodologia padrão para determinação da imunogenicidade da VPP-23v.

De maneira geral, os idosos respondem adequadamente a VPP-23v quando comparados com adultos jovens. Sabe-se também que a resposta é heterogênea frente a todos os sorotipos contidos na vacina. Alguns autores relacionam uma pior resposta imunológica à vacina para idosos, quando analisam subgrupos desta população, como, por exemplo, os pacientes recentemente hospitalizados por pneumonia adquirida na comunidade.

Em relação à duração da proteção vários estudos mostram que quanto mais velho o paciente, mais rápida será a perda dos anticorpos anti-capsular polissacarídeo, sendo que após 3 anos da vacinação, já encontraremos queda acentuada do nível de proteção, como publicado em dois estudos europeus, inclusive com títulos para alguns sorotipos similares aos determinados antes da vacinação e com conseqüente diminuição da proteção específica. Segundo estudo retrospectivo caso-controle realizado por Shapiro após 5 anos de vacina, a proteção contra DIP nos pacientes <55 anos é de 85%, para os pacientes entre 65-74 anos é de 58% e para os 85 anos de 13%.

Portanto, se quisermos resumir os vários estudos que tentam responder o nosso questionamento da duração da proteção da VPP-23v, é aceitável a conclusão de que a queda já ocorre a partir de 3 anos pós-vacinação até cerca de oito anos, dependendo do método e sorotipo estudado. Lamentavelmente não dispomos de estudos que comparem a duração da resposta do idoso usando-se pacientes jovens como controle. Acredito que a perda da imunidade é mais rápida que a suposta anteriormente. O outro questionamento é se a perda do nível de anticorpos reflete perda de proteção.

Sabemos que as vacinas compostas por antígenos polissacarídeos não induzem resposta celular T (são chamadas de vacina T-independente) e, portanto, não apresentam resposta anamnéstica (efeito “booster”) frente à revacinação. Existe recomendação oficial de revacinação em todos idosos 65anos, que tenham recebido a VPP-23v há mais de cinco anos, desde que fossem < 65 anos no momento em que receberam a primeira dose.

Dados relacionados à pacientes adultos jovens revelam que a revacinação irá beneficiar os pacientes que não apresentaram resposta anticórpica na primo-vacinação para determinados sorotipos. Nos pacientes idosos, temos alguma evidência de que a resposta (título de Ac) na revacinação é menor quando comparada à resposta da vacinação inicial, em cerca de 50% a menos.

Portanto, apesar dos dados limitados, parece haver resposta anticórpica em revacinados, apesar de ser menor que a resposta inicial. Provavelmente esta resposta pior está relacionada a fatores como idade avançada e co-morbidades.

A resposta de anticorpos na revacinação podem induzir ao fenômeno de tolerância imunológica já descrito com a vacina anti-meningocócica polissacarídea. Portanto, teremos que determinar um dia se a exposição repetida ao antígeno polissacarídeo da vacina com resposta T-independente irá prolongar ou não a proteção ou se esta resposta irá se extinguir em algum momento.

Indicações da vacina pneumocócica polissacarídea 23-V:
Tem sido recomendada desde 1985 para crianças maiores de 2 anos de idade que apresentam alto risco de doença invasiva, no entanto, estas vacinas não são recomendadas para crianças menores e lactentes devido à pobre resposta de anticorpos antes desta faixa etária.

Atualmente 3 vacinas são licenciadas e comercializadas no Brasil. As vacinas são formuladas com conteúdo de 25 mcg de cada um dos 23 polissacarídeos capsulares purificados de S. pneumonie por dose de 0,5 ml, conservada com fenol ou timerosal, indicada para imunização contra doença pneumocócica causada por um dos 23 tipos de pneumococos que compõem a vacina. Especificamente na área pediátrica tem sido recomendada para crianças com 2 ou mais anos de idade e adultos com doenças crônicas e/ou associadas a um risco aumentado de contrair doença pneumocócica invasiva, tais como:

• Asplenia anatômica ou funcional (incluindo Anemia Falciforme)
• Pacientes em uso de imunossupressores
• Crianças com imunodeficiência congênita e/ou adquirida (HIV)
• Fístulas liquóricas
• Doença renal crônica (incluindo Síndrome Nefrótica)
• Doenças cardiovasculares ou pulmonares crônicas
• Anemia hemolítica
• Doença de Hodgkin
• Mieloma múltiplo
• Cirrose hepática
• Diabetes mellitus
• Transplantes de órgãos e outros associados à imunodepressão

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